alcatruz

Alcatruz, s.m. (do Árabe alcaduz). Vaso de barro e modernamente de zinco, que se ata no calabre da nora, e vasa na calha a água que recebe. A. MORAIS SILVA. DICCIONARIO DA LINGUA PORTUGUESA.RIO DE JANEIRO 1889 ............................................................... O Alcatruz declina qualquer responsabilidade pelos postais afixados que apenas comprometem o signatário ...................... postel: hcmota@ci.uc.pt

17.9.24

 

Saúde dos recém-nascidos neste século em Portugal

 Saúde dos recém-nascidos neste século em Portugal

“A diferença entre a realidade e as narrativas sobre ela” Presidente da República

H. Carmona da Mota

Médico pediatra, aposentado do Hospital Pediátrico e da 
Universidade de Coimbra

Os graves problemas do Serviço Nacional de Saúde não são novos nem exclusivos de Portugal, como não são as severas críticas que se vêm fazendo ao SNS – nem todas justas –, das quais o actual acesso condicionado às maternidades é um exemplo.
Há vinte anos as críticas eram ainda mais duras ("um grande desastre", um "tremendo sistema de saúde [que] coloca os utentes à mercê da ineficiência geral","sistema completamente podre", "horrendos Serviços de Saúde ", "estado caótico do sistema de saúde","... a pior taxa de cobertura sanitária", "...o pior e o mais caro sistema de saúde da Europa"). Como então provei, em artigo no PÚBLICO de 18/1/2004, o SNS era "o melhor serviço público português" e um dos mais eficientes do mundo. Agora, o cenário repete-se.
Apesar de Portugal ser um dos países mais envelhecidos do mundo, o SNS português suportou galhardamente a pandemia,

mas os crónicos problemas agravaram-se: listas de espera e demora de consultas, exames, “cirurgias” e nas urgências hospitalares – acentuados nos períodos de férias de Inverno e Verão –, quando a população – emigrantes e turistas – aumenta muito, desequilibrando o que fora programado para a população residente nos restantes meses.
É um problema já antigo, como recorda Pedro Adão e Silva, referindo o caso das maternidades: "Andamos nisto há pelo menos 25 anos. Chegados ao Natal, Ano Novo e depois ao verão, o abre/fecha maternidades irrompe pela agenda mediática, criando ansiedade social e produzindo um efeito pernicioso na imagem já debilitada do SNS.
Para avaliar objectivamente qual terá sido a repercussão desta situação, analisei os valores da mortalidade dos recém-nascidos, quase todos (99,3%) em maternidades (17,7% em hospitais privados… mas com médicos e enfermeiras oriundos do SNS).
A mortalidade não é o melhor índice da eficácia dos cuidados de saúde, dado que depende muito de factores comportamentais e socioeconómicos; aliás o objectivo do SNS é a saúde, sendo a sobrevivência uma feliz consequência quando o for.
No entanto quando se trata de ajudar todo o recém-nascido que for possível a sobreviver com saúde – o que implica cuidados de qualidade, em especial aos que mais precisam –, a mortalidade é um bom indicador; é tanto mais fiel quanto mais baixos forem os valores – é o caso da mortalidade infantil e, sobretudo, da perinatal portuguesa.
Assim, verifiquei que as taxas de mortalidade perinatal (das últimas semanas de gestação até à primeira semana seguinte), neonatal (no primeiro “mês”) e infantil (no primeiro ano de vida) portuguesas continuam a ser das melhores da Europa e têm continuado a diminuir (últimos dados são de 2023).
Valores da mortalidade neonatal: Portugal 1,62 vs. Estónia 0,83/Chéquia 1,29/Itália 1,57/Letónia1,63/Noruega 1,69/Espanha 1,72/Dinamarca 1,9 e todos os outros com valores acima de 2 (OMS, 2022); isto é, em Portugal morre mais um por cada 1266 recém-nascidos do que no país europeu com melhor valor
Mortalidade infantil (2021): Portugal 2,4 vs. Escandinávia 1,6-2,4/Estónia e Chéquia 2,2/ Itália 2,3 e todos os outros com valores superiores. Também aqui os valores portugueses estão apenas 1,2 ppm acima do melhor europeu. Esta análise confirma o que Teresa Neto e Videira Amaral haviam verificado no período de 2008 a 2018.
Mais, em Portugal conseguiram-se estes valores apesar do contínuo aumento da idade materna, um facto notável que contrasta com o restante panorama europeu. A idade materna tardia é um factor de risco perinatal, entre outras razões, por estar associada à patologia corrente nas sociedades opulentas: excesso de peso (27,5%) e obesidade (15,2%) na gravidez, hipertensão e diabetes – 8,8% em 2018 (Observatório Nacional de Diabetes). Este risco traduz-se numa das mais altas taxas de prematuridade da Europa (Pordata, 2019) e um aumento contínuo da taxa de recém-nascidos de baixo peso, a maior da Europa onde, pelo contrário, esta tem vindo a diminuir.
Saúde dos recém-nascidos neste século em Portugal
Além desses factores de risco há ainda que ter em conta a alteração do padrão demográfico português pela migração – entre 2017 e 2022, a proporção de nados-vivos de mães de nacionalidade estrangeira subiu de 9,7% para 16,7% (INE). Mais de um quinto dos bebés nascidos em 2023 eram filhos de mães estrangeiras residentes em Portugal (INE) que substituíram os filhos de portuguesas que emigraram.
E, por fim – e não menos importante –, os problemas sócio-económicos e do SNS, com orçamento per capita inferior ao de muitos países europeus, agravados pela saída de experientes médicos, enfermeiros e técnicos, nomeadamente nas maternidades.
Estes excelentes resultados que colocam Portugal entre os melhores da Europa não são o exemplo do SNS mas são um exemplo do que se tem conseguido até hoje, apesar das vicissitudes conhecidas. Mais, referem-se aos primeiros tempos de vida de todos os que nasceram em Portugal, privilegiando apenas os que mais precisavam, não os que mais reclamavam. Este sucesso deve-se a vários factores de que sublinho os médicos e enfermeiras das maternidades e dos cuidados de saúde primários que, desde há exactamente 35 anos, estão organizados de acordo com normas oriundas da primeira Comissão Nacional de Saúde Materna e Infantil (1989), um marco fundamental na história do SNS. Um bom exemplo de uma proposta de peritos sensatos que foi assumida pelo poder, no caso a ministra Leonor Beleza, convencida pelos dados colhidos no terreno e pelos argumentos do pediatra Octávio Cunha. Foi assumida a proposta e foram concretizadas as orientações da comissão.
Pela sua pertinência, as normas vêm sendo seguidas com brio até hoje pela rede de cuidados à mãe e ao recém-nascido com resultados que nos orgulham, deixam os pais satisfeitos e todos os novos portugueses tão aptos para o futuro quanto seria possível. Futuro que depende tanto das nossas opções actuais como do seu posterior comportamento.

Revi o que escrevi há vinte anos, moderando o tom: com todos os defeitos que tem – que há que corrigir – e alguns exemplos de excelência – que há que analisar para tentar replicar – é o pior serviço público português excluindo todos os outros e cujos resultados na saúde materno-infantil e noutras áreas (número de transplantes, p.ex.) se mantêm entre os melhores da Europa.


O que exige que todos os responsáveis tudo façam para manter vivo o modelo e o brio indispensáveis para conservar esta qualidade de cuidados, todos os dias, todas as noites e a todas as horas; como tantos vêm fazendo até hoje.


Etiquetas: , ,


Comments: Enviar um comentário

<< Home

Archives

12/2004   01/2005   02/2005   03/2005   04/2005   05/2005   06/2005   07/2005   08/2005   09/2005   10/2005   11/2005   12/2005   01/2006   02/2006   03/2006   04/2006   05/2006   06/2006   07/2006   08/2006   09/2006   10/2006   11/2006   12/2006   01/2007   02/2007   03/2007   04/2007   05/2007   06/2007   07/2007   08/2007   09/2007   10/2007   11/2007   12/2007   01/2008   02/2008   03/2008   04/2008   05/2008   06/2008   07/2008   08/2008   09/2008   10/2008   11/2008   12/2008   01/2009   02/2009   03/2009   04/2009   05/2009   06/2009   07/2009   08/2009   09/2009   10/2009   11/2009   12/2009   01/2010   02/2010   03/2010   04/2010   05/2010   06/2010   07/2010   08/2010   09/2010   10/2010   11/2010   12/2010   01/2011   02/2011   03/2011   04/2011   05/2011   06/2011   07/2011   08/2011   09/2011   10/2011   11/2011   12/2011   01/2012   02/2012   03/2012   04/2012   05/2012   06/2012   07/2012   08/2012   09/2012   10/2012   11/2012   12/2012   01/2013   02/2013   03/2013   04/2013   05/2013   06/2013   07/2013   08/2013   09/2013   10/2013   11/2013   12/2013   01/2014   02/2014   03/2014   04/2014   05/2014   06/2014   07/2014   08/2014   09/2014   10/2014   11/2014   12/2014   01/2015   02/2015   03/2015   04/2015   05/2015   06/2015   07/2015   08/2015   09/2015   10/2015   11/2015   12/2015   01/2016   02/2016   03/2016   04/2016   05/2016   06/2016   07/2016   08/2016   09/2016   10/2016   11/2016   12/2016   01/2017   02/2017   03/2017   04/2017   05/2017   06/2017   07/2017   08/2017   09/2017   10/2017   11/2017   12/2017   01/2018   02/2018   03/2018   04/2018   05/2018   06/2018   07/2018   08/2018   09/2018   10/2018   11/2018   12/2018   01/2019   02/2019   03/2019   04/2019   05/2019   06/2019   07/2019   08/2019   09/2019   10/2019   11/2019   12/2019   01/2020   02/2020   03/2020   04/2020   05/2020   06/2020   07/2020   08/2020   09/2020   10/2020   11/2020   12/2020   01/2021   02/2021   03/2021   04/2021   05/2021   06/2021   07/2021   08/2021   09/2021   10/2021   11/2021   12/2021   01/2022   02/2022   03/2022   04/2022   05/2022   06/2022   07/2022   08/2022   09/2022   10/2022   11/2022   12/2022   01/2023   02/2023   03/2023   04/2023   05/2023   06/2023   07/2023   08/2023   09/2023   10/2023   11/2023   12/2023   01/2024   02/2024   03/2024   04/2024   05/2024   06/2024   07/2024   08/2024   09/2024  

This page is powered by Blogger. Isn't yours?

Site Meter