1. Três gerações para formar um cidadão
- … nunca tínhamos tido globalização, com democracia liberal de
um lado e capitalismo autoritário do outro. E o curioso é que a globalização
está a estabilizar os regimes autoritários, não a miná-los. O facto de as
pessoas terem liberdade privada leva-as a não querer saber da liberdade
pública.
Porquê?
- Preferem a ordem ao caos. Na China dizem-lhes que se lutarem por direitos
democráticos, destroem o país. O mesmo na Rússia. As pessoas escolhem a ordem e
a repressão, desde que isso garanta as suas liberdades privadas.
As novas classes médias, que vêm da pobreza, na China, Rússia ou
Turquia, tendem a não valorizar muito os valores democráticos?
- Aceitam a liberdade privada e são cúmplices do autoritarismo.
As pessoas são levadas a temer a liberdade.
- Penso que sim. Só se aprende a confiar na liberdade quando se tem
instituições como o primado da lei, tribunais independentes, imprensa livre. A
democracia não é só o governo da maioria. Só se perde o medo quando se tem
direitos.
Isso é difícil de construir.
- Muito difícil. Um trabalho de séculos. É preciso criar hábitos da mente e do
coração. Mas eu sou optimista, e acho que a democracia não é apenas uma ideia
europeia. Porque expressa um conceito muito universal: a minha voz vale tanto como
a tua. Ser este apelo moral à igualdade torna a democracia atraente para muitas
pessoas. Mas primeiro é necessário ultrapassar o medo.
Michael Ignatieff foi líder do Partido
Liberal e da Oposição no Canadá, é conselheiro das Nações Unidas e um dos
pensadores políticos mais influentes do mundo.
2. NOTAS DE HONG KONG
Clara Ferreira Gomes Revista 11-10-2014
Occupy
Central morrerá não por pressão de Pequim mas pelas mesmas forças que deram
cabo dos movimentos anteriores; as forças da conservação do sistema, o establishment.
Um habitante de HK
disse-me: “Os mainlanders! Pesadelo. São odiosos, feios, grotescos! Compram e compram e compram, são
animais a quem abriram a porta da jaula."
Admirada com a xenofobia e o rancor deste nativo, fui
perguntando, testando a opinião. Eis uma amostra: “A China é insuportável. Não é só a poluição industrial,
é o materialismo insano de uma gente que gasta todo o dinheiro que tem no jogo
ou em compras porque não tem mais nada que ambicionar. Não têm vida mental. Não
conhecem o gosto da liberdade. O Partido pensa por eles.
Os
comerciantes impedem isto porque precisam de ganhar dinheiro".
3.Multidão
“(...)Vejo
uma multidão imensa de homens semelhantes e de igual condição girando sem
descanso à volta de si mesmos, (…) Acima desses homens, ergue-se um poder
imenso e tutelar que se encarrega sozinho da organização dos seus prazeres e de
velar pelo seu destino. É um poder absoluto, pormenorizado, ordenado,
previdente e suave.
Agrada-lhe que os cidadãos se
divirtam, conquanto pensem apenas nisso. Garante-lhes a segurança, previne e satisfaz as suas necessidades,
facilita-lhes os prazeres, conduz os seus principais assuntos, dirige a sua
indústria, regulamenta as suas sucessões, divide as suas heranças. Será também
possível poupar inteiramente aos cidadãos o trabalho de pensar e a dificuldade
de viver? (...) Tocqueville em 1840:
4. O partido-estado é o partido dos
interesses permanentes, mesmo que seja um partido inorgânico, pastoso,
conglomerado e difuso. No plano formal é um partido nuvem, mas no plano
material é um partido clientelar, onde reinam e se experimentam, recorrentemente, o calculismo
e a tática político-partidária. O partido-estado é, também, um campo de treino
por excelência, por onde circulam e se formam as chamadas elites partidárias e
se faz a chamada reciclagem dos dirigentes partidários.
O partido-estado é um
partido transversal, é um transpartido que acolhe cerca de 6 milhões de
portugueses que, directa ou indirectamente, dependem das suas remunerações,
benefícios, prestações e contratos. Este partido-estado atravessa
transversalmente o espectro político-partidário português, é o único que não
vai a eleições e que não é escrutinado pelo povo que diz servir.
O partido-estado e a constelação de
poderes que lhe está subjacente fazem ruir qualquer tentativa de “equação
orçamental” que procure responder aos problemas estruturais da sociedade
portuguesa
5. Les gens de la moyenne.
Colette Magny Mai 68