alcatruz

Alcatruz, s.m. (do Árabe alcaduz). Vaso de barro e modernamente de zinco, que se ata no calabre da nora, e vasa na calha a água que recebe. A. MORAIS SILVA. DICCIONARIO DA LINGUA PORTUGUESA.RIO DE JANEIRO 1889 ............................................................... O Alcatruz declina qualquer responsabilidade pelos postais afixados que apenas comprometem o signatário ...................... postel: hcmota@ci.uc.pt

13.10.12

Para Angola, rapidamente e em força

A partida
(a primeira carta)

O "Infante D. Henrique" era o melhor paquete de então; muitos anos depois
estava na sucata em Sines donde foi recuperado e reactivado

Vou sozinho no paquete Infante D. Henrique, em 1ª classe como se impunha a um oficial (alferes) do exército, com a minha farda branca obrigatória e apenas um fatito fresco para a vida social em Luanda.

Houve uma largada de serpentinas sugerida pala Compª Colonial de Navegação (CCN) que pôs à disposição dos passageiros rolos onde predominavam as cores (verde e branca) da CCN, o que estragou um pouco a imagem notável que Somerset Maugham nos dá num dos seus contos:

Quando o nosso navio parte de Honolulu, penduram-nos ao pescoço "leis", que são grinaldas de flores, levemente odoríferas. O cais regurgita de povo e a banda toca uma derretida melodia havaiana. Os passageiros atiram serpentinas aos que ficam e a amurada do navio engalana-se toda com finas fitas de papel de cor alegre. Depois, quando navio começa a se afastar do porto, as serpentinas rompem-se com um leve estalido.

É como a ruptura dos laços humanos.

Homens e mulheres são momentaneamente unidos por uma fita de papel de cor alegre. Depois, a vida separa-os e as serpentinas rompem-se com um leve estalido. Por algumas horas, os seus fragmentos tremulam ao longo do casco, até que o vento os leva. As flores de nossa grinalda murcham e seu aroma torna-se opressivo. Então, deitamo-las ao mar.

(W. S. Maugham - Post scriptum de "Histórias dos Mares do Sul")

Depois, pouco a pouco, o barco afasta-se, as fitas rompem-se com pequenos estalidos, os lenços agitam-se e perdemos o contacto físico com a terra. Mas o barco, levemente inclinado para o cais, os rostos petrificados ou desmoronados em soluços e um leve aperto na garganta mostra que, no fundo, se mantém a dimensão vegetal do homem cujas raízes sofrem quando as arrancam da sua terra.

Mas, passadas horas, tudo tinha passado, os cachopos corriam e gritavam e os mais crescidos recolhiam aos camarotes ou reclinavam pelos sofás do convés a sua náusea amarela.

Depois foi a descida do Tejo passando pelo “Pátria” (o melhor paquete antes deste), metade do “Infante D. Henrique”; na margem, em frente dos Jerónimos, o recente Padrão dos Descobrimentos. Pese as opiniões contrárias à oficial, de que agora é insistente porta voz o ministro Adriano Moreira, pese essa opinião contrária, o monumento com o Infante na proa da nau da história de velas enfunadas e, atrás, os grandes capitães do mar, o povo-marinheiro, mercadores e o clero – frades missionários --, dá a impressão nítida de que o Infante é empurrado pelos que lhe ficam atrás, o que deu origem à piada segundo a qual o Infante diria – Não empurrem que a ponte ainda não está feita.

Mais abaixo a maravilha da torre de Belém e a contrastar, na margem oposta, a ridícula imponência da estátua do Cristo Rei, um Cristo de braços abertos com que a dizer que não teve culpa...

Tomei um Nauseton e fui almoçar...

Não foram fáceis as refeições naqueles nove dias de mar; os passageiros da 1ª classe eram todos colonos que não se coibiam de expor as suas opiniões sobre a situação. Era essa situação que eu ia defender; uma introdução que valeu quanto tinha lido sobre o colonialismo. Além do mais, como não sentiam o enjoo serviam-se com apetite enquanto eu o experimentava pela primeira vez. Ainda hoje o relaciono como o cheiro das tintas dos barcos.

Etiquetas: angola guerra

posted by HCM # 13:30

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