Alcatruz, s.m. (do Árabe alcaduz). Vaso de barro e modernamente de zinco, que se ata no calabre da nora, e vasa na calha a água que recebe. A. MORAIS SILVA. DICCIONARIO DA LINGUA PORTUGUESA.RIO DE JANEIRO 1889 ............................................................... O Alcatruz declina qualquer responsabilidade pelos postais afixados que apenas comprometem o signatário ...................... postel: hcmota@ci.uc.pt
Reunião de Curso em Alcobaça 2
O Mosteiro é um bom exemplo para “edificação” da meia-idade; sobre uma bela base proto-gótica tentaram enxertar uma máscara barroca, então na moda. Ficou esta miscelânea que vale mais pelas proporções que pelos detalhes; não valeu a pena a plástica.
O esplendor da nave central não precisa de adereços. Continua magnífica como quando foi construída segundo a regra despojada de Cister; como se a pilhagem bárbara da multidão em fúria vingativa, “queimando, partindo e roubando tudo, num pandemónio indescritível de cobiça e desmando” quando as Ordens foram extintas fosse a caldeira do alambique onde se destilou a história para condensar a essência.
“... já a multidão se espalhava pelo Mosteiro, queimando, partindo e roubando tudo o que encontrava, num pandemónio indescritível de cobiça e desmando. Os frades tinham fugido cada um para destino incerto, temendo pela vida. Uns refugiaram-se nas granjas. Outros meteram-se ao caminho para outros mosteiros. Os mais procurando no anonimato a segurança. Muitos levaram, eles próprios, alguns bens de
maior valor e mais transaccionáveis, temendo pelo futuro. E a dor inacreditável, que ainda há pouco parecia impossível, de ver o Mosteiro abandonado, Santa Maria de Alcobaça, na sua descomunal grandeza, a mais rica entidade do reino, reduzida a uma inerte soma de paredes e edifícios devassados por uma febre devoradora de depredação, latrocínio, pilhagem e saque. Como se uma infinita tristeza vestisse de luto invisível aquelas pedras pelo tempo fora. Até nunca mais." (Luis Rosa)
O canto coral gregoriano pega nas palavras, acentua as sílabas, torce-as, estica-as até ao limite – à espera que se depurem da ganga literal e fique apenas a essência da mensagem, perceptível por todos, clérigos ou leigos, letrados ou não – Pentecostes – que todos são filhos de Deus.
O que o coro fez com as palavras, o Tuna e o Durval fizeram com os sons das cordas, António Vieira com as frases e o estatuário com a pedra: "Arranca o estatuário uma pedra dessas montanhas, tosca, bruta, dura, informe, e, depois que desbastou o mais grosso, toma o maço e o cinzel na mão, e começa a formar um homem, primeiro membro a membro, e depois feição por feição, até a mais miúda: ondeia-lhe os cabelos, alisa-lhe a testa, rasga-lhe os olhos, afila-lhe o nariz, abre-lhe a boca, avulta-lhe as faces, torneia-lhe o pescoço, estende-lhe os braços, espalma-lhe as mãos, divide-lhe os dedos, lança-lhe os vestidos; aqui desprega, ali arruga, acolá recama, e fica um homem perfeito, e talvez um santo que se pode pôr no altar."
É gratificante pensar que todos estes sons e os passados ficarão gravados nas pedras
do Mosteiro**, para sempre disponíveis como nas espiras do vinil, à espera que os recuperem e interpretem; as pedras aguardam pacientes e impassíveis, como as siglas nas paredes ou a esfinge da mitologia. Daqui a alguns anos será possível recuperar toda a memória sonora aqui arquivada todos estes pelas séculos e restaurar a história e a melodia desta tarde – a balada das Alpenduradas por exemplo.
* O Pinto Mendes, outro condiscípulo melómano (chefe de naipe do Orfeon), explicou porque é que os sons da guitarra do Tuna eram tão puros – dedilhava as cordas sem as arranhar. Brilhante diagnóstico; aqueles que sempre apreciaram as originais interpretações do Jorge, a melhor guitarra da nossa geração, têm agora um novo argumento.
A explicação terá a ver com a sua formação; o facto de ser médico, cardiologista e Professor da Universidade justificam esta técnica requintada -- a preferência pelos tons puros das cordas sem qualquer sopro adventício, sinal de incompetência valvular.
** ... esta noite passei-a a ouvir os sons inaudíveis de tudo o que foi dito neste Mosteiro, em todos os séculos da sua história.(Luis Rosa)
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