alcatruz

Caro HCM, leio som assiduidade o seu blog. Aprecio a sua inteligência e perspicácia. Quase sempre concordo consigo. Quase nunca comento. Neste ponto discordo e este comentário vale por vários posts sobre este tema – a despenalização da IVG nas primeiras 10 semanas. Não que eu tenha quaisquer certezas. Não que defenda a condição feminina acima de qualquer suspeita e nunca acima da condição humana. Não sei quando começa a “vida humana”. Sei que há embriões excedentários. Sei que há vidas e vidas. Todas diferentes. Defendo a dignidade da vida e não só da humana. Se a lei do aborto que agora vigora pode ser suficiente em países como a Espanha, não me parece que o seja por cá. Por cá vigora o julgamento e a punição mais na mentalidade das pessoas e das instituições do que na própria lei. Grande parte das mulheres que decidem fazer um aborto, fazem-no precoce e clandestinamente, sem sequer antes procurarem ajuda ou aconselhamento junto a qualquer estabelecimento se saúde. Porque será? Talvez porque sabem que não serão ouvidas, porque sabem que serão julgadas à partida e condenadas sem que a sua decisão seja considerada. No próximo dia 11, não vamos votar numa lei, vamos votar na possibilidade de mudar a lei que temos. Vamos votar na possibilidade de elaborar uma lei mais justa, mais aberta, menos “moralista”. Vamos votar na possibilidade da mulher que decide fazer um aborto até às dez semanas de gestação ( um “crime” que quase ninguém quer ver punido), poder recorrer a uma “consulta de gravidez indesejada”, sem medo, para que possa reflectir melhor e, se mantiver a opção de abandonar a gravidez, poder fazê-lo rapidamente e em segurança. Não é o que eu penso nem o que eu faria que está em causa. Em causa está a injustiça que é não fazer nada para alterar a situação actual. É uma situação difícil. A despenalização é a solução mais fácil? Vamos ser invadidos por clínicas espanholas? Não sei. Não tenho muitas esperanças no nosso País ( nos seu dirigentes), mas parece evidente que reprimir a interrupção das gravidezes indesejadas não é solução. Todas as outras medidas para proteger a maternidade, garantir uma educação sexual universal e um planeamento familiar responsável, melhorar as condições de vida, etc. não estão em causa e devem ser apoiadas. Um corrupto será sempre um corrupto; o mercado será sempre comandado pelo lucro e continuará a promover o leite em pó; uma mulher que fez um aborto ainda pode optar por amamentar os filhos que decidir ter.